Friday, March 17, 2006

As dádivas do silêncio e de ouvir.

As dádivas do silêncio e de ouvir.
Bruno de Assis.
Andamos cansados. No atropelo dos dias, quando paramos e temos uma breve "consciência-de-si" pesa-se uma exaustão. Não é um esgotamento do vigor físico ou mesmo um mal-estar mental. É um cansaço existencial.
A alma anda, nada, dana - e naufraga - numa frequente in.tranquilidade, uma frequência anímica in.descritível que gera - ou é gerada pela - ansiedade, a alma torna-se um "livro do desassossego", dizia o poeta lusitano. Diante dessas in.tranquilidades, a tendência é "ligar a TV", "curtir uma música", ou mesmo "ouvir o rádio". Ou ficar com alguém. Usamos corpos - descartavéis - pra tapar os fragmentos que se encontram na alma...
Há uma in.compatibilidade humana com o Silêncio. Não o abrigamos em nosso caótico íntimo. Poucos são que se tornam Amigos do Vazio de Ruídos.
Engraçado, tememos ouvir nossos abismos e vozes interiores ou mesmo vislumbrar a nudez - ou os tumores - da nossa alma.
Há "Silêncios" e Silêncios.
Há os que são mórbidos, lúgubres...in.terpretam na mudez principalmente das pessoas que trazem um "tom" mais extrovertido. Quansdo ficam silenciosas, delatam o peso da alma, denso como chumbo.
Há um outro silêncio que é Presente, amigo e acolhedor. Um silêncio que acolhe a palavra - e o coração - do outro. Não sabemos ouvir e também temos dificuldade de encontrar bons-ouvintes, pacíficos e silenciosos. Somos todos cheios de "fórmulas", "respostas prontas", que ao invés de auxiliar e servir o outro, denota-se um inconsciente medo de acolher o próximo. E sem a atenção merecida e sendo um mau - ou medíocre - ouvinte, cheios de orgulho, projetamos os nossos "testemunhos" e nossas "obsoletas fórmulas" pra "resolver o problema", pensando que a alma humana é como a produção de uma fábrica e que se resolveu conosco vai se resolver - igualzinho - com o outro.
Há problemas que querendo ou não, são insolúveis. Uma delas é a Morte.
Mas um bom ouvinte tem a capacidade de pacificar, e acolher em amor, o outro que o mundo não acolhe. Mais fácil é excluí-los de nossa atenção e agenda. Afinal, "tenho que me preocupar com a minha vida, afinal ela é minha..."
Se não conseguimos ouvir o nosso semelhante, imagine Deus.
A nossa era e sociedade cultuam o barulho e o ruído. Temos que ter frequentes estímulos, ler o jornal rapidamente - não criando assim uma consicência crítica -, ir ao fast-food e comer ansiosa e sôfregamente os hamburguers - e também há o "fast foda" - até o sexo se torna consumo, tudo é muito rápido e decorado. As posições parecem mecanismos pré-condicionados. E como ouvintes, nas partilhas entre amigos, sabemos que muitas vezes nas relações humanas, e dentre elas, no sexo, mesmo com o corpo presente, a alma do sujeito(a) está em Titã, uma das luas que compõe os satélites de Saturno e a outra sabe-se lá aonde...
O Silêncio e o Ouvir traz a consciência de nossos abismos e limites, moldando o humús, a humildade no deserto do nosso ser.
Thomas Merton, monge trapista, refletindo acerca disso, coloca em cheque não apenas o "falante" e sim o bom ouvinte, que também sofre um certo conflito, confinado nos segredos partilhados em seus silênciosos encontros de alma. Merton diz assim: "Grandes padres, santos como o Cura d'Ars, que olharam as secretas profundezas de tantas almas, não deixaram, entretanto, de ser homens de poucos amigos íntimos. Ninguém é mais solitário do que um padre que serve a um vasto ministério. ele está confinado em um terrível deserto pelos segredos dos seus semelhantes."
Porquê digo isso? Que além de sermos bons ouvintes, criar uma rotina de nos acolher em silêncio, há uma necessidade do homem de parar, de reservar tempo pra si, de ouvir suas melodias e dissonâncias interiores. Percebendo a aridez da nossa alma, damos mais valor a Água Viva que nos é oferecida - e partilhada - em nosso cinzento cotidiano. Silêncio, nos coloca a ouvir Deus com mais atenção, ou percebê-Lo habitando em nosso íntimo.
Concluo, com Faustina Kowalska, uma cristã polaca do século XX. "O Silêncio é como a espada na luta espiritual; a alma tagarela nunca atingirá a santidade. Essa espada do silêncio cortará tudo que queira apegar-se à alma. Somos sensíveis à fala e sendo sensíveis, logo queremos responder; não levamos emconta se é da vontade de Deus que falemos. A alma silenciosa é forte; nenhuma adversidade a prejudicará, se perseverar no silêncio. A alma recolhida é capaz da mais profunda união com Deus, ela vive quase sempre sob a inspiração do Espírito Santo. Deus opera sem obstáculo na alma silenciosa."
Paz, Bem & Dias mais Silenciosos,
B!

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