Sunday, August 21, 2005

Um antigo devocional.....

"Assim como a água relflete o rosto, o coração reflete quem somos nós."

"Como na água o rosto corresponde ao rosto, assim o coração do homem ao homem."

"O rosto se reflete na água, e o homem reflete em sua consciência."

...são três versões de Provérbios 27:19.

Muitas vezes quando alguém pregunta o - porquê dessa cara feia? - ou, - Tá triste? - nós nos pegamos de surpresa, pois não imaginávamos que nossa face refletia o nosso estado íntimo. Com a atenção do outro, conseguimos perceber o que acontece no nosso espírito. Os sentimentos aparecem nas diversas formas de tristeza, angústia, alegria, saudades, culpa, ressentimento...e outra gama de sensibilidades que carregamos em nosso interior.


Descobrimos que com a nossa conversão, quando caminhamos "de volta pra casa do Pai", nós nos deparamos em muitas situações não muito "gloriosas", ou "cheias de bençãos". Literalmente, Des-Cobrimos (tiramos a coberta...) de muitos sentimentos hostis que estão aninhados e enraizados na nossa subjetividade. Elas se manifestam de muitas formas, como ressentimento com um familiar, a falta de perdão com o cônjuge, os sentimentos de culpa que minam em nosso espírito e explodem em angústias, insônias e problemas nos ossos. Outrora, não é culpa, mas uma sombra que carregamos, o nosso velho homem, que ressurge avassaladoramente e se manifesta na forma de uma tímida crueldade através de um enrustido preconceito, desejos, que se vermos bem, não são desejos...são perversões.


Outrora, uma armadilha que armamos com o - colega (???) - da empresa...a infidelidade que temos com o cônjuge, com a família e consigo mesmo.


O Evangelho é radical quando vemos que Deus trouxe o Espírito Santo para questionar o nosso espírito. O Consolador e Ajudador é aquele que na regeneração do nosso pensamento (metanóia), faz-nos refletir o que somos - não numa mente culpada e sôfrega, isso é nossa consciência - mas sim, filhos de Deus. Temos consciência de nossos erros, omissões e faltas, porém, Deus não tira de nós a dignidade e nos limpa de todo peso pecaminoso através do sangue derramado na Cruz. Temos a chance de mudar de lado, de arrancar, lançar ao Alto o nosso "karma existencial" e buscar novos horizontes, ao lado Dele. Deus é o único Ser que é capaz de mudar a nossa compulsão íntima pelo pecado. Deus, deseja através do Espírito Santo formar o Filho de Deus em nós e ainda fazer dos nossos corpos, Habitat Dele.


Ainda me questiono porquê Ele não vai habitar na árvore, na roseira...


Oração: "...que o meu coração não reflita as petições de uma criança mimada, mas um coração que conhece a Ti. Não quero pedir, perdir, pedir...quero expor o que acontece dentro de mim, como um amigo diz ao Melhor Amigo. Ou então, falar de juras de amor, carinho, palavras benignas...ao Amado. Mude o meu coração caído, a minha consciência que se encontra tão distorcida, cauterizada pelo pecado, outrora pervertida. Dá me um coração igual ao Teu. Essa é a parte mais difícil......mas que, antes de um anseio íntimo em relação à minha pessoa, que eu conheça ao Senhor e eu siga os seus passos.

Amém!

Wednesday, August 17, 2005

Da Solidão à Solitude....

Aqui deixo mais um texto....antigo....mas que sempre volto à refletir....
Que a nossa Solidão Morbida trnsmuta-se em Solitude Bela,
B.
***
Na noite de sábado para domingo, andarilhando de volta pra casa na cidade de Santo André, me encontrava pensativo, introspecto, contemplando minha consciência que, nesses momentos de estar consigo mesma ela recebe as visitas inóspitas de sons, ruídos, vozes e imagens que imprimem o universo absurdo e surreal que forma a nossa psiquê...

E andarilhava, andarilhava...

Passei por uns barzinhos lá no bairro Jardim. Um moço distraído numa das mesas acabou se assustando comigo, pois do nada, em meio ao escuro acabei aparecendo, e ainda com uma camisa parecida com a do Freddy Krueguer (acho que é assim que escreve...) e isso me chamou a atenção para ficar por ali...

Daí, comecei a espiar as pessoas que estavam nos bares, espiar só por espiar...perceber a multiplicidade de personalidades, as ambiguidades que o ser humano carrega dentro de si e espelha em seus gestos físicos, olhares e sorrisos...

A minha primeira impressão foi a de que mesmo muitos estando acompanhados dos amigos, desfrutando de uma cerveja, contando as situações mais engraçadas ou mesmo trágicas, notava que em seus olhos eram (e continuam sendo...) inquietos, buscavam sempre "achar" alguém, vivem procurando algo que não sabem direito o que é, um instinto de "caça" sobrevinham do íntimo deles e os delatavam através dos gestos que procuravam, inconscientes ou não, uma forma de afirmar-se como seres humanos. O que é saudável, até certo ponto.

Isso me leva a lembrar uma peça do Samuel Beckett, chamada "Esperando Godot" que narra através do texto desse grande escritor, essa espera humana que é composta por pessoas tremendamente solitárias. E eles procuram e esperam Algo ou Alguém...no caso, Godot, mas não sabem quem é direito e ainda nem sabe o porquê o que buscam realmente.

Vi muitos casais e amigos se abraçando, beijando e tendo os seus efêmeros momentos de prazer. Via muitos deles presentes em seus estilos, formas e conversas, mas alguns, quer dizer, em muitos notava que era muito longínqua a transparência no espírito. Notavam que muitos embora fisicamente presentes, estavam ausentes no espírito do grupo.

Continuando minha caminhada, chegando perto de casa, o frio foi me apertando, resolvi "cortar" caminho por um bairro aqui ao lado que não tenho costume de andarilhar...e fui continuando a minha espiada noturna, percebendo as casas, notar o visual, a construção, o design arquitetônico...

...notei que muitas salas estavam sendo iluminadas com a televisão, havia muita gente acordada...e isso, lá pelas duas horas da manhã...

Mas houve uma cena que me marcou muito. Estava passando quando vi que em uma das casas a janela da sala estava entreaberta e com a luz acesa. Andando mais devagar pela rua, vi que um homem, um senhor de uns 60 anos estava sentado no sofá. O que mais me chamou a atenção foi o olhar deste homem. Ele olhava pra TV, só que com certeza não estava assistindo o que passava na tela. O olhar havia profundência, nostalgia, estava longínquo, com uma leve "paletada" de melancolia, notava que estava perdido em si-mesmo. Os olhos denunciavam alarmantemente isso.

Também como os olhos do pessoal do barzinho.

Delatava a SOLIDÃO que todos eles sentem, esse vazio que é como um buraco negro que está sendo dilatado mais e mais...

Daí, caminhando pra casa e já chegando ao ninho de descanso, comecei a levar minha consciência (ou é ela que me leva???) à reflexão:

Será que os homens têm consciência da solidão que eles sofrem?

Que ela é mais profunda do que imaginamos?

E que como colocamos falsos "ban-daids existenciais" (televisão, rádio, namoros de um dia...) pra tapar esse mal-estar que o homem sofre (ainda...) nesse começo de século?

Ou...

Será que essa é uma impressão que tenho é uma exteriorização, um reflexo da solidão que sinto e procuro disfarçá-la nessas palavras que digito no teclado?

Noto que a solidão não é a ausência de pessoas, mas é a ausência de uma Pessoa. Pois vejo que mesmo com a multidão, ou mesmo com seus amigos, família, relacionamentos saudáveis, há pessoas que são tremendamente solitárias. Ela, a solidão, tem um fator que transcende a questão física. Ela também é espiritual. Parece que há a falta de Algo que foge dos nossos graus de amizade, de bondade e das virtudes humanas.

É essa falta que brota do íntimo do coração, esse "Quê Transcendente" que o homem sente uma ausência aonde o homem não consegue disfarçar e que nos gestos, acabam delatando-se.

Creio que o homem tem que dar a si mesmo a oportunidade de parar. Parar. De ter um encontro consigo mesmo. Mesmo que isso mostre fantasmas, enfrentar os assombros da alma e o sentimento de impotência que urge de nosso ser. E diante desse vazio dar lugar a um Outro que, na verdade, é mais intimo a nós do que nós a nós mesmos.

E da solidão, dar lugar à solitude.

Solitude é diferente da solidão. É um momento que parando toda a nossa atividade externa, damos atenção ao nosso íntimo. De ter um encontro também com um Outro. De descobrir no silêncio e na oração, o Amor e a Companhia de Deus. De um Deus que transcende a religião e que é experimentado não nas grandes festividades religiosas ou em êxtases promovidos nos cultos. Mas sim, descobri-lo em um lugar aonde estamos paulatinamente num processo alienativo, que é dentro do nosso coração.

Saturday, August 13, 2005

Conto....à Caminho de Olimpo.

Conto:
Caminho de Olimpo
Outrora, M., voltando pra casa, pensava nas “tropeçadas existenciais” que afligia o espírito, e nesse momento em que estava quase só, era novamente, bem ou mal, acompanhado pela consciência, juntamente com as imagens e ruídos que se somam lá nos meandros da mente...uma azáfama inconsciente.Lembrava quando à pouco se despedia do Professor Hermes e da Professora Nilse. Logo após a aula de pintura, ambos conversavam sobre um assunto que fugia do universo das paletas.
M., só espiava.
Discutiam sobre a importância que temos que dar à nossa historicidade pessoal, sempre lembrar dos momentos que a Vida interfiriu em nossas existências e que tivemos plena consciência desse frequente acontecimento, pois Ela, a Vida sempre está interferindo em nossa história individual e coletiva, mesmo nós não tendo total ou parcial consciência do fato e que nos momentos de dificuldade, a memória é uma das forças-motores que nos fazem levar a nossa vida pra frente, buscando imprimir um sentido e conseguir vislumbrar, mesmo em nossas incertezas, o futuro.
Ele não entendera nada e não quis atrapalhá-los. Achava esses artistas dementes. Sentia-se bem no meio deles. Se despediu.
Carregava um Quadro que tinha pintado e ia levar para uma exposição. Estava feliz, era a primeira vez que ia expor o seu trabalho artístico.
Descendo a ladeira, ouve um barulho de motor. Saiu correndo indo atrás do veículo coletivo, mas não o alcançou. Aliás, nem o viu. Baixou a cabeça, respirou fundo, olhou para o lado e falou:
- Vamos?
E M., foi indo com um cachorro magrelo, dos olhos esbugalhados, carinhoso e companheiro que o acompanhara desde a saída da Aula de Artes.
Só que havia um quê de diferente, algo que permeiava dentro de M., uma Sensação, um Sentimento que fugia do comum. Não sabia discernir se era Medo ou Insegurança. Na dúvida, já estava atravessando o Vale...com o Companheiro Canino ao lado.
Passando pela Rua das Delícias, encontrara duas Ninfas Noturnas que trabalham por ali. Uma delas o reconhecera e fez um aceno. Parou e uma delas se lançou num forte abraço. Começaram a conversar. - Belas e Profanas - pensou, sempre minguando das dificuldades que encontram na Vida e no Vale, outrora falavam de coisas engraçadas, satíricas e talvez dionisíacas. Porém, logo após ele achava tudo estranho, pois parecia que se conhecíam há anos...ele não se lembrava dela e numa hora distraída, o Medo fez uma visita frequente dentro de si, afinal, estava sozinho. Quer dizer, com o Companheiro Canino entregue ao sono.
Houve um momento que percebendo uma delas, N., notou que ela, embora forçava, não imprimia um jeito vulgar, "aberta" para novas situações, seus gestos eram discretos e o olhar que havia um quê de Maldito e Angelical, havia Autodestrutividade e Anseio de Plenitude, um pedaço de Divino e Mefistofélico, havia Algo Oculto.
M., olhando nos olhos da Lilith do Vale, mudou o tom da voz.
- Porquê você se encontra aqui?
Ela, num jeito maroto e malicioso, com os cabelos negros desalinhados e olhando com um tom felino para o companheiro de M., expressou:
- Para acompanhar alguns cachorros, que nem você.
Brincou e fez um afago no cão.
Ela fez um pedido.
- Não diga à ninguém que você me encontrou por aqui. Mais tarde estarei em casa. - E ficou séria. Desértica. Deu um forte abraço e foi fazer o seu ofício.

Desamparado e continuando a caminhada, o cachorro acordado com o toque da Ninfa, voltou a acompanhar o dono, foi andarilhando, cumprimentando desconhecidos trausentes que passavam, e M., conversava com o cachorro, pessoas viam e riam, mas era assim que M., é feliz.
Desviando numa rua e chegando aonde precisava levar o Quadro, esbarra num homem negro, alto, de feições fortes e tez séria. O homem resmunga e o xinga em pensamentos.
Continuou o caminho.
O homem, percebendo o esbarro, olha de soslaio para M., e assoviou em direção ao jovem assustado acompanhado do cachorro.
Assoviou novamente.
M., começou a gelar em seu íntimo. Os nervos começaram a inflamar. E foi ouvindo os passos mais rápidos e pesados do - Gigante Negro – devaneava ele. E uma série de imagens começou, insconscientemente, invadir a mente:
- Será que vou ser machucado? Não, não vou dar mole, vou reagir se ele me atacar! Se ele estiver armado? E se eu pegar o...
Ele preparou o quadro pra acertar o trausente que o perseguia.
Sentiu uma Mão pegando em seu ombro.
M. se virou.
- Ô, M., a su...su...sua casa é ali! Você pa...pa...passou direto! So...Sou eu, o Heros! Tu, tu esbarrou em mim e nem, nem me cumprimentou! Vo... Você tá, tá bem Guri? – perguntava, bêbado, o Gigante que além de estar embriagado, era gago.
- Nossa, que susto! Tudo...bem. – dizia, com os a alma visceralmente gelada.
M., pediu um minutinho. Foi até o muro e urinou.
O cheiro de vinho era forte. Um breve estado de torpor dominava o ar e a mente do homem negro.
Heros é um amigo da rua. E da casa também. E que engraçado! Ele era um Negro vindo do Rio Grande do Sul. Estava por ali pra fazer um complemento dos estudos em psiquiatria e trabalhando num hospital naquelas redondezas. Buscava de alguma forma em suas pesquisas, vislumbrar a Psiquê, esse Mistério, herança dos deuses, presenteado nos humanos.
Começaram a conversar. Foi passando o tempo e o torpor fora embora.
Ele era um daqueles que tentavam contar piadas, com breve infelicidade, mas, o seu carisma supria a falta de estilo de contar uma anedota, e tentava:
- “Um louco perguntou ao outro. “O que tenho aqui na minha mão?” perguntava um dos loucos com a mão fechada.
- O outro respondia: “Um elefantinho”.
- O que perguntou fez uma cara triste e gritava “Não vale!, Não vale!, Você viu o rabinho!!!”.
M., ficou sério, resolveu perguntar como é que tava a vida do conhecido.
Falaram das dificuldades que a Vida impõe. Da incerteza de enfrentar o Real e, M. numa inconsciente distração, falou do encontro que M., teve com a Ninfa.
Heros suspirou para Maíra, a Lua que estava no céu e confessou ao amigo.
- Será que ela faz eu perder o meu controle ou sou eu que faço perder o controle dela?
- Como assim? – Assustado, ouvindo o amigo.
- Deixe pra lá. Não é assunto pra você. É uma história que só eu e ela podemos resolver, mas, tenho que te confessar, eu sou muito ligado à ela.
M., não compreendia o mal-estar de seu amigo. Falava da Lua ou de alguma mulher?
Levantaram, o Gigante Negro “bateu” a sujeira das calças e caminhou com o amigo ao portão.
- Pronto, amigo. Você está em casa. Ah! E não esqueça o Quadro.
M., entra na portão e atravessa o jardim.
Heros olha para o alto novamente, percebe uma faixa e lê:
Clínica Psiquiátrica Olimpo. Terapia Ocupacional com Artes Plásticas. Venha ver as Obras de Arte dos internos. Tem Escultura, Mosaicos, Teatro e Pintura.
Lembrou uma vez quando um professor na universidade perguntou qual era a linha tênue que dividia o homem da loucura, e lembrou de Nilse, que era a única mulher do grupo, pequenina, miúda. Ela, de uma forma imponente e séria, levantou e expressou:
- Arte, é Arte Professor!
Estudou e procurou tratar seus pacientes não através de eletrochoques e todo tratamento denso que os pacientes eram submetidos, mas com paletas, argila,dando oportunidade à pacientes como M., esquizofrênico, expressar sua alma e suas sombras.
Assoviou novamente e veio Thor, o cachorro adestrado do Hospício, que trazia os pacientes que se perdiam na parte interna ou nas imediações da Clínica.
Heros sorriu. Sentiu alguém abraçá-lo por trás.
Era Ninfa.
- Encontrei ele sozinho, por isso que liguei pra você. Perdôe-me em atrapalhar o seu “drink”. Ele é tratado de esquizofrênia, e o diagnóstico foi uma “perenização do presente”, ele ainda pensa que tem seus 26 anos, quando a doença o afligiu Pensa, age, veste a roupa como um garotão. Agora ele já tem 43. Sempre perde a noção de realidade, e estava preocupada se ele se perdesse ou não achasse a “casa”. Tem mania de perseguição. Mesmo sem as crises de “surto”, ele não reconhece muito de seus amigos e parentes.
Ninfa, a enfermeira, abraçou Dr. Heros e seguiu pra ala dos pacientes de neurologia. Mas antes, foram terminar com a garrafa de vinho.